Sabendo
que, do ponto de vista do Processo Administrativo, não existem referências aos
vícios do acto administrativo e que, desde os anos 80, quando foi revogada uma
versão das Lei das Autarquias Locais, não há existe lei que contenha a enumeração
dos vícios do acto administrativo, faz sentido questionar o que leva os
Tribunais Administrativos a continuarem a falar em vício do acto administrativo?
Tendo
em conta que os vícios são uma forma incompleta de determinação da realidade, e
que do ponto de vista processual não identificam a causa de pedir, cabe ao
particular invocar qual o seu direito e qual o comportamento ilegal da
Administração que justifica a sua ida a tribunal.
O
artigo 78º não faz referência aos vícios do acto e, assim sendo, no quadro de uma nova lógica do
contencioso que conhece na integralidade as ilegalidades da actuação
administrativa, impõe-se que se deixe de considerar esta dimensão limitada na
análise da ilegalidade e que se abra a causa de pedir à realidade actual.
Contudo,
a questão mantém-se quanto a saber quando surge de facto o direito do
particular e se pode ou não o juiz trazer a juízo factos não invocados pelas
partes.
Neste
ponto estão em causa visões diferentes do processo administrativo e dos princípios
do processo administrativo, nomeadamente do princípio do acusatório e do seu
relacionamento com o principio do inquisitório.
Para
Mário Aroso de Almeida, que defende uma concepção processualista do direito
substantivo, o direito do particular só surge no momento em que o particular
reage à actuação da Administração e assim sendo, estes direitos correspondem a
pretensões ao afastamento da ilegalidade do acto administrativo. Está em causa
uma tentativa de construir em termos substantivos os direitos dos particulares
nas relações jurídicas administrativas, ao dizer que esses direitos só surgem
no momento em que o particular reage através do processo.
Vasco
Pereira da Silva, por outro lado, considera que o direito do particular não se
confunde com o seu direito a ir a juízo, este é um direito processual que é
consequência da titularidade do direito substantivo e que tem como finalidade a
tutela desse mesmo direito. Deve distinguir-se o modo como entendemos os
direitos dos particulares do modo como eles se reflectem na relação jurídica
processual.
Esta
confusão entre a posição jurídica de vantagem em termos substantivos com a posição
de vantagem em termos processuais tem consequências no modo como entendemos o
objecto do processo no Contencioso Administrativo, reflectindo-se na maior
importância conferida à dimensão inquisitória se adoptarmos a ideia do direito
reactivo e na mais intensa valoração do principio do acusatório se adoptarmos a
perspectiva do Professor Vasco Pereira da Silva.
Mário
Aroso de Almeida atribui maior importância à dimensão inquisitória, conferindo
ao juiz o poder de transportar factos novos para o processo, equiparando a posição
do juiz à actuação do Ministério Público.
Contudo, segundo Vasco Pereira da Silva, não faz qualquer sentido
confundir o juiz, que é um terceiro estranho ao processo, com uma parte, e
assim sendo, o juiz deve conhecer integralmente dos factos trazidos ao processo
mas limitando-se sempre aos factos
alegados pelas partes. Assim sendo, o processo é marcado pelo princípio
do acusatório, embora coexistam alguns aspectos de tipo inquisitório.
Esta
questão está relacionada com o artigo 95º. Este artigo consagra um alargamento
dos poderes do juiz, o que corresponde a uma maior dimensão inquisitória, ou
estabelece uma lógica meramente acusatória?
A
interpretação do art. 95 nº1 é específica. O legislador diz que a sentença deve
conhecer de todas as questões submetidas pelas partes à sua apreciação e não
pode ocupar-se de outras, salvo
quando a lei permita ou imponha o conhecimento oficioso. Assim sendo, temos que
este artigo consagra uma regra geral em que atribui maior relevância ao princípio
do acusatório.
Contudo, é preciso não esquecer, que o juiz pode qualificar os factos de forma
diferente daquele que foi feita pelas partes, mas isso não significa que posso
trazer novos factos a juízo. O Tribunal pode corrigir a qualificação, se a
considerar errada no modo como foi apresentada pelas partes, mas isso não
significa que possa trazer factos novos para o processo. É necessário então
aferir qual o poder do juiz e quais os seus limites e conjugar esse poder com a
nova lógica do objecto do processo, aquela que nos impõe conhecer na integralidade
a ilegalidade do acto administrativo.
Assim sendo, se o juiz detectar uma errada qualificação dos factos pela
parte, pode alterar essa qualificação, mas sempre limitando-se aos factos
alegados pelas partes.
Maria Ana Sousa
140112086
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