terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Crónicas do Serviço de Urgências Administrativo – Episódio II

Certamente o suspense não é igual ao do romance de Meredith e Derek, mas não estava ansioso pela continuação desta saga? Fique connosco e descubra os restantes instrumentos deste nosso (e vosso!) Serviço de Urgências.

Hoje começamos por vos apresentar o CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL. Este nasceu do direito europeu e resulta das directivas sobre contratação pública. É um facto que já havendo infecção, é muito difícil conseguir afastar-se a doença. Dado isto, a criação de um quadro que verifique o preenchimento de uma série de realidades pré-contratuais não poderia ser mais oportuna. Este procedimento tem uma consequência automática: a suspensão do contrato contagiado (art.103.º - A). A sua utilização permite que se concentrem todos os focos de discussão pré-contratual e que, consequentemente, se reduza a actuação em sede de contencioso contratual (chegamos mais uma vez ao Princípio da Prevenção já referido).
O âmbito de aplicação deste mecanismo não é, de todo, tão amplo como o do nosso Serviço Nacional de Saúde: o art.100.º apresenta-nos uma enumeração taxativa (e restritiva!). Apenas estão abrangidos dois tipos de pedidos: fala-se de realidades que correspondem aos esquizofrénicos contratos administrativos mas também de contratos tipicamente privados. No entanto, há que ter em conta que esta última categoria não corresponde a um tipo de contratos tipicamente sujeitos ao direito administrativo, o que nos faz concluir que a esquizofrenia se mantém não só do lado do paciente!! O Prof. Vasco Pereira da Silva propõe que se refiram todos os contratos regulados no código de contratação pública, por forma a alargar o âmbito deste mecanismo mas também de sanar esta sua demência.
Passemos agora a uma ala um pouco diferente deste Serviço de Urgência: as INTIMAÇÕES. Aqui deparamo-nos com uma verdadeira condenação, mas simplificada, nomeadamente em matéria de obtenção de informações.
Este mecanismo começou como um processo complementar, regulado como uma providência cautelar (algo que faz parte de cenas dos próximos episódios). Hoje em dia, tem um largo âmbito, mas no início estava restringida à obtenção de documentos para auxiliar um processo principal. A jurisprudência começou, todavia, a utilizar este mecanismo para suprimir faltas de cooperação da administração com o particular, e a reforma de 2002 acabou por contribuir em muito para o seu alargamento.
Para além de tutelar o direito à informação do particular, este mecanismo conduziu a uma tutela muito activa dos direitos destes mesmos particulares em sede de contencioso administrativo.
Por fim, chegamos à INTIMAÇÃO PARA PROTECÇÃO DE DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS.
Esta surgiu por influência de uma espécie de providência cautelar do direito francês, no sentido de alargar os poderes de condenação do juíz relativamente à administração.
Tem um âmbito de aplicação bastante restritivo, abrangendo apenas direitos, liberdades e garantias de interesse pessoal.
Esta sua concepção é fortemente defendida pela Professora Carla Amado Gomes com base no art. 20.º da C.R.P. O Professor Vasco Pereira da Silva entende que a norma constitucional não pode impor limites processuais ao Direito Administrativo que, assim sendo, o art. 20.º vale para qualquer dimensão de natureza processual. Dado isto, quando muito alarga (nunca restringe!) o âmbito desta instituição.
Uma interpretação literal leva-nos a concluir que todos os regimes de direitos, liberdades e garantias se aplicam aos direitos de natureza análoga. Mais do que uma analogia, o Professor Vasco Pereira da Silva encontra aqui uma relação de identidade. Há que ter em conta que, independentemente da concepção que se siga, chegamos a uma mesma conclusão: o regime deve aplicar-se não só a direitos, liberdades e garantias mas também a direitos de natureza económica, social e cultural. A jurisprudência tem actuado nos termos amplos entendidos pela doutrina, alargando este mecanismo.

FIM DO SEGUNDO EPISÓDIO

A apresentação deste Serviço de Urgência está concluída. Gostou assim tanto? Gostava de saber mais sobre esta incrível realidade do Contencioso Administrativo? Ao jeito de Private Practice também nós temos uma Addison que desertou (mas não para Los Angeles, continuamos em Portugal, e não para o Privado, continuamos no Direito Público). Se está realmente interessado não perca – PROVIDÊNCIAS CAUTELARES – O OUTRO LADO DA URGÊNCIA. Até lá!


 Maria Inês Serrazina
140112006

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