quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

55º, nº2 CPTA -Um Ato Falhado!



A família já vai na estrada. Do Porto ao Algarve são quase 600Km. A viagem de férias corre a bom ritmo quando, às portas de Coimbra, a mãe se lembra que com os preparativos de última hora, com a azáfama da viagem, é possível que tenha deixado o ferro de engomar ligado. E, na dúvida, voltam todos para trás!
A situação é prosaica, já aconteceu pelo menos uma vez em quase todas as famílias. E acontece precisamente com o nosso legislador também. Exemplo disso é precisamente o nº2 do art.55º do novíssimo CPTA, uma norma que não acrescenta grande coisa, mas que o legislador entendeu que havia de introduzir. A tal dúvida da mãe, ou por outra, uma excessiva prevenção.
Vasco Pereira da Silva critica e tem razão, não podendo eu senão acompanhá-lo na sua pertinente observação.
Diz este artigo 55º, no seu nº2, que é permitido ao eleitor, no gozo dos seus direitos civis e políticos, impugnar as decisões e deliberações tomadas pelos órgãos das autarquias locais. Ora , esta ação popular que vem aqui referida era a expressão popular que existia antes, no passado, nos termos do Código Administrativo apenas e que vigorava apenas em relação às ações intentadas contra as atuações administrativas de órgãos de natureza local. Isto, quer se tratasse de autarquias locais quer se tratasse de órgãos locais do Estado. Era a regra que existia antes da reforma que em Portugal vigorou desde o séc. XIX até à lei de 85.
Porém, esta regra foi substituída pelo alargamento da lei de ação popular, a lei de 95, também ela alterada com esta reforma, que estabelecia a ação popular não apenas para os órgãos de caracter local, mas também para os órgãos de caráter nacional. Assim sendo, não há grandes dúvidas de que o alargamento introduzido pela lei de 95 e recebido pelo art.10º fazia com que, de alguma forma, essa norma fosse completamente desnecessária.
A mãe da família de férias também ela tinha quase a certeza de que não teria deixado o ferro ligado, mas preferiu andar 100Km para trás só para ter a certeza. E chega a casa e percebe que o ferro estava mesmo desligado.
Assim foi com o legislador que, em 2002-2004, teve medo que não incluir a norma significasse deixar cair alguma coisa. «Um disparate!», refere Vasco Pereira da Silva. E explica: «Se antes só havia ação popular em relação aos órgãos autárquicos e agora se diz que há em relação a todos, não carece dizer que há também em relação aos autárquicos, porque há em relação a todas as entidades e não é preciso repetir que há em relação aos órgãos autárquicos! É algo que é desnecessário e que se pode entender como um ato falhado».
Mesmo quem tentou encontrar diferenças, como Luís Fábrica, em 2002, tentou mas não as encontrou!
Sem dúvida, um ato falhado. O legislador teve medo de deixar de fora alguma coisa quando «já tinha estabelecido mais do que o menos». 
Como conclui Vasco Pereira da Silva, poder-se-á explicar apenas sob o ponto de vista psicanalítico, mas do ponto de vista da racionalidade, não. Ainda que daí não venha mal ao mundo.

Helena Fonseca
Aluna nº 140112507

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