"Terra de ninguém? :"
As operações materiais e o novo CPTA.
Seguiram-se
algumas teorias contrárias como a teoria das
“circunstancias excecionais” que tentaram justificar a tutela dos tribunais
administrativos sobre as operações materiais recorrendo muitas vezes a
complexos raciocínios que acabavam por não fazer grande sentido. A Professora
Carla Amado Gomes tem vindo a defender que este tipo de conduta administrativo
cabe à competência dos tribunais administrativos por via da Acção para o
reconhecimento de direitos prevista constitucionalmente desde 1982.
Hoje
a questão foi resolvida pelo legislador que optou por expressamente atribuir
aos tribunais administrativos a competência de julgar as operações materiais.
Esta decisão foi aplaudida pela doutrina moderna e enquadra-se mais
coerentemente na nova lógica de actuação pluriforme da Administração. Esta opção
encontra-se expressamente plasmada na alínea i) do nº 2 do artigoº 2 e na alínea
i) do nº 1 do artigo º 37 do CPTA e na alínea i) no nº1 do artigo º4 do ETAF
(Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais), que referem “via de facto”.
Pode se assim extrair destas normas atribuidoras de competências o Principio da
competência do contencioso administrativo sobre as “operações materiais
administrativas”, verdadeira expressão da prevalência da materialidade
subjacente sob a égide dos direitos subjetivos públicos e do processo de
partes. Não querendo “dar um passo mais longo do que a perna”, pode-se indicar
algumas consequências deste princípio, nomeadamente a nível interpretativo.
Dentro da mera interpretação literal ou declarativa lata pode-se integrar as
operações materiais no campo de aplicação quer da Intimação para proteção de
direitos liberdades e garantias, nos termos do nº 1 do artigo º109 do CPTA,
quer de Processos cautelares tanto por via do nº1 com por via da alínea i) do
nº2 do artigo 112º. Nestes casos torna-se necessário, à luz do princípio
evidenciado, a inclusão nestes dois institutos, pelo facto de a letra o
permitir e pelo facto de a natureza muitas vezes urgente ou imediata dos
litígios sobre vias de facto o exigir. Poderá noutras sedes este princípio
reclamar uma interpretação extensiva de algumas normas quando a mera interpretação
declarativa destas impeça injustificadamente a defesa dos direitos dos
particulares, face a este tipo de atuação informal da administração. Um exemplo
disto será o do artigo 66º do CPTA no qual se deve estender o conceito de “acto
administrativo” à via de facto cuja omissão seja lesiva de direitos dos
particulares. Alem destes, outros exemplos se podiam dar como reflexos deste
principio no contexto do novo CPTA no entanto, ainda existem muitas questões que
podiam ser mais desenvolvidas pelo legislador no âmbito do contencioso das
operações materiais administrativas e que ficam certamente aguardando futuras
reformas.
Podemos
concluir que esta ultima reforma do CPTA foi também em matéria das operações
materiais uma reforma benéfica por consolidar a competência dos tribunais
administrativos sobre esta matéria acabando de vez com esta incerteza
“esquizofrénica” , isto é dando definitivamente um dono à “terra de ninguém”.
Gonçalo Calheiros Veloso, nº140112059
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