O caso Blanco baseia-se numa decisão de 8 de fevereiro de
1873, do Tribunal de Conflitos. Revelando um dos grandes traumas de infância do
Contencioso Administrativo, Este caso é marcado por uma lógica de poder e
desigualdade.
A 3 de novembro de 1871, Agnès Blanco, uma criança de 5
anos, foi atropelada por uma carruagem da tabacaria regional, explorada
pelo Estado, em Bordéus.
Agnés em consequência do acidente, sofreu lesões corporais
graves, entre elas uma lesão no fémur, que ditou a amputação da perna.
O pai de Agnés, Jean Blanco, ingressou, em 24 de janeiro de
1872, no tribunal de justiça com uma acção de responsabilidade civil contra os
trabalhadores responsáveis e solidariamente contra o Estado, como civilmente
responsável pela actuação dos seus agentes. O tribunal de justiça declarou-se
incompetente, por estar em causa uma empresa pública, esclarecendo que mesmo
que pudesse decidir, não havia lei aplicável, visto que o Code Napoléon
apenas de aplicava a situações entre iguais, o que não era o caso.
Surgiu, então, um conflito entre a jurisdição judicial e a
jurisdição administrativa, que seria resolvido pelo Tribunal de Conflitos,a
quem compete decidir sobre a competência para julgar a causa. Os quatro membros
de cada jurisdição, nao chegaram a um consenso, tendo havido um empate. O
presidente do Tribunal de Conflitos desempatou o mesmo, com um voto a favor da
jurisdição administrativa.
O caso Blanco não foi no entanto absolutamente pioneiro. Em
1855 o caso Rothschild demonstra a origem da ideia de que o Estado deve
responder pelos danos causados pelos seus agentes, no exercício de suas
funções.
No caso em causa, em 1874 o o Conseil d’État,
declarado competente para decidir o caso, concederia à vitima uma renda
vitalícia. Surgem assim as bases da teoria do risco administrativo, com o
estabelecimento de responsabilidade objectiva do Estado por danos causados
pelos seus agentes.
Esta decisão acaba por definir a competência da jurisdição administrativa assim como o conteúdo do Direito Administrativo. O acórdão refere a inexistência de lei aplicável, e a necessidade de criar um ramo de direito novo e autónomo para proteger a Administração;
“Considerando pode incumbir ao Estado ser responsabilizado
pelos danos causados aos particulares, causados pelas pessoas empregadas pelo
serviço público, esta não pode ser regida pelos princípios que são
estabelecidos no Código Civil, para as relações jurídicas de particular a
particular; E que esta responsabilidade não é plena nem absoluta; que tem
regras especiais que variam de acordo com as necessidades do serviço e a
necessidade de conciliar o direito Administrativo com o direito civil.”
Arrêt Blanco du Tribunal des Conflits sur Légifrance (www.legifrance.gouv.fr).
O caso Blanco além de ter sido um marco importante na
história do contencioso administrativo francês, teve repercussões posteriores
no nosso próprio contencioso.
Deste caso resultou que o Estado tinha de responder perante
particulares prejudicados pela administração e que os tribunais administrativos
poderiam acolher as demandas dos particulares contra o Estado. Foi, portanto, o
primeiro passo para consagrar o que hoje conhecemos como responsabilidade civil
extracontratual do Estado.
Sem comentários:
Enviar um comentário