quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Proposta de resolução da hipótese I - acção de condenação à prática do acto devido

Caso prático:

Bruno apresentou à Câmara Municipal Y, em 16 de Junho de 2008, um pedido de licenciamento de uma moradia a construir em terreno de que é proprietário. No requerimento então apresentado, daga conta da urgência na obtenção do licenciamento uma vez que necessitava da moradia para residir com a sua família, designadamente por estar iminente o nascimento de filhos gémeos, o que tornaria o apartamento em que actualmente reside manifestamente exíguo para o agregado familiar.
Em 16 de Julho, não tendo obtido resposta da Câmara, Bruno propõe acção administrativa especial para condenação à prática do acto devido. Pretendia ver a Câmara condenada a emitir a licença de construção.
A Câmara alegou em sua defesa que ainda não tinha decorrido o prazo legalmente estabelecido para proferir uma decisão, pelo que faltaria ao pedido de Bruno este pressuposto. Quem terá razão?

Matéria factual relevante:
  • 16 de Junho - Bruno apresenta à câmara municipal um pedido de licenciamento para construir moradia em terreno seu 
  • 16 de Julho - não tendo obtido resposta, propõe acção administrativa para a condenação à prática do acto devido - emissão da licença de construção
  • Câmara alega que não decorreu o prazo legalmente estabelecido, faltando o pressuposto para intentar a acção de condenação.
Proposta de Resolução:

A consagração de uma acção de condenação da AP à prática de acto administrativo devido (arts. 66º e ss), enquanto modalidade da acção administrativa, constitui uma das principais manifestações da mudança de paradigma na lógica do Contencioso Administrativo. Tradicionalmente, o Contencioso Administrativo tinha como “centro” o recurso directo de anulação, pelo que a condenação da AP só era admitida enquanto tal, de forma limitada, no domínio das acções (em matéria de contratos e de responsabilidade) e, no âmbito do contencioso de anulação, através da ficção do “acto tácito de indeferimento”
O pedido imediato da acção de condenação destina-se a obter a condenação da entidade competente à prática, dentro de determinado prazo, de um acto que tenha sido ilegalmente omitido ou recusado. No caso concreto estamos perante uma omissão (se verificados os pressupostos) 
Nos termos do art. 67º e seguintes, os pressupostos processuais específicos, sempre que estejam em causa pedidos de condenação são (1) A existência de uma omissão de decisão por parte da AP, não tendo sido esta decisão proferida dentro do prazo legalmente estabelecido nos termos do art. 67º/1 al. a) ou que tenha sido praticado acto administrativo de indeferimento ou de recusa de apreciação do requerimento nos termos da al. b) ou ainda que tenha sido praticado acto de administrativo de conteúdo positivo que não satisfaça integralmente a pretensão nos termos da alínea c) (2) Legitimidade das partes nos termos do art. 68º (3) Oportunidade do pedido nos termos do art. 69º.
De acordo com o art. 67º/1 al. a) a condenação da Administração à prática de acto devido pode ser pedida quando não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido. Ora, de acordo com os dados da hipótese, passou 1 mês desde a apresentação do pedido à entidade competente; o prazo para a decisão vem regulado no art. 128º/1 do CPA e consagra que os procedimentos de iniciativa particular devem ser decididos no prazo de 90 dias. Ora se não foi proferida decisão, mas ainda não decorreu o prazo legalmente estabelecido, então está em falta um dos pressupostos para a condenação.  O particular não está então ainda em posição de intentar uma acção de condenação para a prátca de acto devido, por ainda não ter decorrido o prazo e ainda não haver omissão juridicamente relevante.
Segue-se o pressuposto da legitimidade  - este pressuposto está verificado nos termos do art. 68º/1 al. a) uma vez que quem pede a condenação da Administração à prática do acto devido é Bruno, alegando ser titular de um direito, dirigido à emissão do acto (neste caso a licença de construção). Contudo, deparamo-nos com um problema: o tribunal não tem necessariamente de condenar à prática de um acto favorável, mas simplesmente condenar à prática de um acto - só poderia condenar à prática do acto devido se o particular tivesse, sem necessidade de licenciamento, direito a construir na sua propriedade. Indubitável é, que a Administração Pública está obrigada a proferir decisão  nos termos do art. 13º/1 do CPA, contudo não significa que a resposta seja favorável. Não havendo um direito em si próprio mas sim uma situação que cai no âmbito dos poderes discricionários da Administração o tribunal pode, quanto muito, dar indicações do modo correcto do exercício desses poderes. Bruno, proprietário do terreno, não está automaticamente autorizado a construir no terreno; a partir do séc. XX com o surgimento do Estado Social, esta ideia de “sou o proprietário e, como tal, posso construir” desaparece - à partida o particular pode usar da sua propriedade em tudo aquilo que não esteja afastado pela existência de outros valores que o Estado prossiga - tais como velar pelo modo como a cidade está organizada através de planos de urbanismo e ordenamento do território que acabam por impedir esta liberdade de construção. 

Posto isto, os pressupostos principais para que haja lugar a uma acção de condenação são: a formulação de pedido/ ao órgão competente/ dentro de um determinado prazo; se estas três condições não se verificarem, não se verifica o pressuposto processual da omissão para que haja lugar à acção. Se verificadas as condições, nos termos do art. 71º/1 do CPTA,  ao não haver resposta devida ao requerimento, o tribunal não se limita a devolver a questão ao órgão administrativo competente, mas pronuncia-se sobre a pretensão material do interessado, impondo a prática do acto devido; já o nº2 estabelece que quanto a emissão do acto pretendido envolva a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa, o tribunal não pode determinar o conteúdo o acto a praticar, mas deve explicitar as vinculações a observar pela Administração na emissão do acto devido, ou seja, sendo a discricionariedade um modo de realização do direito, cujos parâmetros podem ser jurisdicionalmente controlados e, sendo inúmeras as situações em que a AP se encontra obrigada a actuar, embora o conteúdo da decisão a adoptar dependa de escolhas que são da sua responsabilidade, as sentenças de condenação à prática de acto devido não podem limitar-se a cominar a prática de um acto administrativo, antes devem determinar, em concreto, qual o âmbito e o limite das vinculações legais. 

Maria Joana Navarro Moreira - 140112139
Carolina Correia Gonçalves - 140112042

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