Da legitimidade nos contratos públicos
No quadro dos modernos contratos públicos, em que os
sujeitos susceptíveis de ser afectados pelos mesmos vão muito além dos seus intervenientes,
tornou-se imperativo alargar o conceito de parte legítima sob pena de esvaziar
por completo este pressuposto processual ou reduzi-lo a “quase nada”. No âmbito
das relações multilaterais, que passaram a ser a regra nos contratos públicos,
torna-se tarefa impossível prever ex ante
quem poderão ser os possíveis lesados por determinado contrato, obrigando
assim o legislador a criar uma solução ajustada à realidade. Assim, no que
respeita aos contratos públicos, isto é, todos aqueles que são celebrados no
exercício da função administrativa, temos regras especiais quanto à legitimidade
e prazos, de acordo com os artigos 77º-A e 77º-B do CPTA.
O alargamento do conceito de parte legítima começa por ter
expressão no artigo 77/1-b) ao conferir legitimidade ao Ministério Público, o
que é compreensível no âmbito dos interesses que defende, nomeadamente a
legalidade democrática. Posteriormente, o artigo 77º/1-c) atribui legitimidade processual a quem tenha
sido prejudicado pelo facto de não ter sido adoptado o procedimento
pré-contratual legalmente exigido, isto é, a título de exemplo, a impugnação de
um contrato público por adjudicação de uma obra a uma determinada empresa sem
ter havido concurso público nos termos da lei, sendo um alargamento crucial e com bastante tradução prática, Por sua vez, a aliena d deste artigo vai no mesmo sentido da
anterior, na medida em que assegura ao particular a possibilidade de impugnar
um contrato administrativo não obstante de já ter impugnado os actos procedimentais
que deram origem a esse contrato. A alínea g é criticável, na medida em que se
apresenta como uma repetição desnecessária em face do disposto no número 3 do
mesmo artigo, não fazendo sentido incluí-la na impugnação da validade do
contrato mas apenas na sua execução. Também se apresenta como alvo de grandes
críticas a alínea h, que remete para o artigo 9º/2 do mesmo diploma, ao incluir o actor popular como parte legítima na acção, o que se revela excessivo e
injustificado, uma vez que em ultima análise qualquer pessoa pode impugnar um
contrato sem sequer ter sido afectado ou lesado por ele. Esta possibilidade põe
em causa a própria natureza jurídica dos contratos, na medida em que permite a
sujeitos que são completamente alheios ao conteúdo desse contrato e que nenhum
interesse digno de tutela merecem, interferir nesse mesmo acordo, criando nele
um efeito erga omnes inadmissível à luz do nosso ordenamento e que se repete no numero 3 referente à execução do contrato.
Carolina Gonçalves
140112042
Sem comentários:
Enviar um comentário