O ATO TÁCITO DE INDEFERIMENTO E A AÇÃO DE CONDENAÇÃO Á PRÁTICA DE ATO DEVIDO
-DA ALEMANHA A PORTUGAL -
-DA ALEMANHA A PORTUGAL -
O
Contencioso Administrativo marcado pela sua infância difícil na separação entre
administração e justiça conduziu a uma forma limitada de intervenção do juiz.
Inicialmente o Contencioso era de mera anulação.
Nos termos
do atual art.66º.CPTA e seguindo de perto a perspetiva Alemã, o legislador
português veio permitir a condenação da administração à prática de um ato (ato
este entendido em termos amplos, designadamente no art.67º. que tanto abrange
os casos: i) em que a administração não praticou um ato devido, omitindo a
pratica desse ato, como aqueles casos ii) em que é negado “ilicitamente” ao
particular o pedido que este dirige à administração).
O legislador
adoptou esta noção ampla, supra referida, a qual permite reagir contra ações e
omissões, e estabeleceu um mecanismo que permitiu resolver os casos em que o
particular tenha reagido contra o ato pedindo a sua anulação. Isto significa
uma preferência do legislador para que o pedido seja o de condenação, como
refere o professor Vasco Pereira da Silva, trata-se de um convite do juiz “á
dança” – art.51/4º. CPTA.
Em meados do século XIX começaram a surgiram as primeiras ações de
condenação no domínio contratual e da responsabilidade civil, por exemplo no domínio
da energia onde estava em causa o fornecimento de eletricidade a uma
determinada cidade.
Admitiu-se que nesses domínio dos contratos pudessem existir sentenças
condenatórias e pedidos condenatórios. Ao contrário dos contratos, no domínio
do ato e do regulamento as manifestações máximas do juiz eram de simples
anulação das decisões administrativas. E eram consequência do princípio da
separação de poderes.
Esta
realidade descrita anteriormente vai corresponder a uma dimensão histórica do
século XX que vai conduzir ao surgimento do ato tácito de indeferimento, no
direito francês.
Estes atos tácitos de indeferimento são o quê na realidade? De fomra
muito simplista, sem querer alargar-me nesta breve exposição, posso afirmar que
se tratam daqueles casos em que a administração tem um dever de atuar de determinada
maneira, e para evitar que a administração deixe de cumprir a lei ou omita atos
administrativos vai-se considerar que esta inação deliberada da administração publica
deva poder valer como um ato tácito/fingido para abrir a porta ao contencioso
administrativo – foi assim que nasceu a teoria do ato de indeferimento tácito- que
permitia que num contencioso de anulação se pudesse reagir contra omissões administrativas
. Esta realidade assentava numa ficção,
para conseguir algo próximo de um efeito quase condenatório. Na prática
fingia-se que quando a administração
nada fazia esta estava a praticar um ato de indeferimento, e como tal fingia-se
que o particular podia ir a tribunal por se fingir que verdadeiramente de um
ato se tratava. Também o juiz fingia que estava perante um ato para fingir que
o anulava.. e a anulação do não ato correspondia á pratica de um ato de sentido
contrario.
Para não
esquecer esta matéria que marca a história do nosso Contencioso, podemos aqui
neste espaço relembrar a analogia feita em aula pelo Sr. Professor quando se
referiu a Fernando Pessoa dizendo que este no poema do “poeta é um fingidor” ao
pé desta estratégia de impugnação de um ato fictício era um verdadeiro amador! Uma vez que a administração aqui vai além do
domínio da poesia...
Ora esta realidade para além de ser do ponto de vista teórico uma autêntica
charada conduzia a consequências práticas nefastas: o particular não se
preocupava em impugnar, o juiz não o considerava e no fim do processo da
sentença não resultava a ideia de que havia o dever de praticar um ato em
sentido contrário.
Nessa altura
surgiram problemas a esta suposta anulação de um ato tácito de indeferimento:
· A condenação á
pratica de um ato ≠ condenação á pratica de um ato em sentido diverso.
Do ponto de vista teórico era difícil conceber que a anulação de um não
ato pudesse conduzir á condenação na prática de um outro ato diverso.
(No quadro do Direito Alemão a seguir á guerra, na reconstrução da
Alemanha que assenta na lógica da lei fundamental cria-se uma lei de
contencioso administrativo razoavelmente eficaz- e abandona-se este modelo
francês – assim surgiram as ações de condenação. Estas não se destinavam apenas
a esta realidade de omissões administrativas mas entendeu-se que ultrapassado o
tabu da impossibilidade e admitida a possibilidade de condenação da administração
que ela devia existir tanto relativamente a omissões quanto a atos de conteúdo
negativo.
E esta lógica vai dar origem a um meio processual novo. – ação de
cumprimento de um dever que conduzia a uma condenação na consequência de um
pedido: tanto nos casos em que a administração não tinha atuado, como nos casos
em que tinha atuado e praticado ato de sentido negativo.)
ASSIM
DESCENDO AO NOSSO ORDENAMENTO JURÍDICO:
EM PORTUGAL
Uma das
principais manifestações da mudança de paradigma na lógica do Contencioso
administrativo foi a consagração de uma acção de condenação à prática do acto
administrativo devido (arts. 66º e seguintes do CPA), enquanto modalidade de
acção administrativa especial (qualificada em razão do pedido).
Seguiu-se o modelo alemão que é caracterizado pela sua
grande amplitude, podemos retirar este argumento da análise do corpo de duas
normas: art.66º e art.67º.
Diz-se no art.66/1 “atos omitidos ou condenados”.
Também do art.67º. se pode falar numa grande amplitude dos pedidos, uma
vez que é possível reagir contra pedidos mesmo quando a administração não tenha
satisfeito integralmente aquilo que o particular lhe suscitou.
Em casos de
atos administrativos com conteúdo
negativo , ainda que parcialmente negativo, o pedido adequado é o de
condenação. E este devia prevalecer sobre eventuais pedidos de anulação que
pudessem ter lugar. O legislador manifestou esta preferência pela condenação ao
estabelecer um mecanismo processual que está previsto no art.51º./4 CPTA em que
se estabelece que nos casos em que se está perante um indeferimento ou recusa
de apreciação, se houver um pedido de impugnação, pode-se apresentar um pedido
de condenação.
Este art.51º. do CPTA mostra uma preferência pelo legislador, no caso de
atos negativos ou omissões, pelo pedido de condenação.
Esta solução do art.51º resultou de discussões no quadro do projeto de
2002/2004 em que se chegou a estabelecer que o Tribunal podia oficiosamente
transformar o pedido de anulação num pedido de condenação.
Embora, e de acordo com a posição do Sr. Professor Vasco Pereira da
Silva, uma regra deste género seja atentatória do princípio do contraditório e
o juiz não possa a título oficioso fazê-lo- embora possa convidar as partes a
isso.
Questão
diferente é a de saber se não obstante esta regra, se é possível e faz sentido
que o particular perante um ato de conteúdo negativo mantenha apenas o pedido
de anulação:
Em Portugal temos uma única forma de processo e o facto de ter havido um
engano não leva a uma absolvição do pedido e não há razões para que o
particular que se encontra perante um ato de conteúdo negativo possa não optar
por não manter o pedido de condenação (porque fica mais protegido por este) do
que pela ação de anulação.
Assim percebe-se que o legislador
não se tenha preocupado muito com a ação de anulação (não se preocupou com o
prosseguimento do pedido anulatório porque no caso do direito português, a
substituição do pedido opera no quadro da mesma realidade processual e o
particular não tem vantagens no pedido de anulação quando pode obter mais que isto
com o pedido de condenação) e tenha manifestado maior preferência pela ação de
condenação.
NOTA:
Esta solução
Portuguesa é diferente da Alemã uma vez que o sistema jurídico alemão possui
meios processuais completamente separados e a ação de condenação é muito
diferente da ação de anulação. Entende-se que nos casos em que o particular usou
um pedido de anulação e o juíz ainda acha que apesar de tudo se pode atender ao
pedido, admite-se que a ação de anulação possa ter lugar e se satisfaça o
pedido do particular.
Verónica Nobre
(140112030)
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